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Dimensões do trabalho

Trípalium era um instrumento feito de três paus aguçados, algumas vezes ainda munidos de pontas de ferro, no qual os agricultores bateriam o trigo, as espigas de milho, para rasgá-los, esfiapa-os. A maioria dos dicionários, contudo, registra tripalium apenas como instrumento de tortura, o que teria sido originalmente, ou se tornado depois. A tripalium se liga o verbo do latim vulgar tripaliare, que significa justamente "torturar".

Essa é uma faceta da realidade evocada no termo trabalho, aquela que revela a dureza, a fadiga, a dificuldade, irreversivelmente constitutivas da vida humana. Talvez por isso não seja incomum encontrar no repertório simbólico de diversas culturas tal percepção do trabalho como pena.


Mas o que de fato é trabalho? Uma definição plausível pode ser a capacidade de o homem criar e transformar a natureza. Nesse âmbito, o trabalho envolve uma concepção mais ampla do que a simples concepção de trabalho enquanto pena.


Mas o que de fato distingue o trabalho humano, do trabalho realizado pelos animais? Vejamos a explicação de Marx:


“Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção dos favos de suas colméias. Mas o que distingue, de antemão, o pior arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça, antes de construí-lo em sua colméia. No fim do processo de trabalho obtém-se um resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhador, e, portanto, idealmente. Ele não apenas efetua uma transformação da forma da matéria natural: realiza, ao mesmo tempo, na matéria natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie e o modo de sua atividade e ao qual tem que subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um acontecimento isolado. Além dos órgãos que trabalham, é exigida a vontade orientada a um fim, que se manifesta com atenção durante todo o tempo de trabalho.”


Para todos que compartilham do pensamento de Marx, o que distingue o trabalho humano do trabalho realizado pelos animais é que nele há uma intencionalidade, consciência, sendo que os animais trabalham por instinto, sem consciência ou intencionalidade. Por meio do trabalho se expressa a liberdade humana, uma vez que os seres humanos por mais que sejam explorados em determinadas atividades produtivas não podem ser programáveis como robôs.


O único ser vivo capaz de agir além daquilo que seu equipamento biológico permite de imediato é o homem. Ele não é provido de asas e de estrutura óssea favorável ao vôo, mas voa inventando um avião. Ele não está equipado para retirar oxigênio diretamente da água, mas isso não o impede de descer ao fundo dos mares. Tudo isso indica que o homem é um animal ímpar. Embora permanecendo animal, livra se dos laços que o prendem à natureza.


Essa idéia de Marx ajuda a quebrar a idéia de uma grande dissociação entre o trabalho intelectual (aquele em que não se produz de imediato nada de visível) e o trabalho manual, corporal, (que resulta em algo perceptível, uma mudança de estado). Pensemos, por exemplo, na atividade exercida pelo pedreiro. Ele não utiliza sua inteligência e raciocínio para erguer uma parede de tijolos? E no caso de um intelectual que escreve um livro. Esse escritor não tem um desgaste físico ao escrever esse livro?


Por essa analogia podemos perceber que a separação entre trabalho intelectual e o manual é uma falácia criada ao longo da história. Essa divisão acontece porque ao longo de muito tempo se procurou valorizar as pessoas que se especializaram somente em pensar, em organizar o trabalho dos outros e desvalorizar quem executa trabalhos que requerem força física. E claro, que essas pessoas que mandavam começaram a acumular poder em suas mãos decidindo o que é certo e o que é errado, sempre é claro, procurando favorecer o grupo ao qual pertenciam. Nesse sentido a divisão entre trabalho intelectual e manual foi utilizada como um instrumento e ao mesmo tempo falso argumento para dominar e explorar determinados grupos sociais.



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