Foi visto que as idéias iluministas acerca da liberdade estiveram presentes na independência da América Latina. Essas idéias levaram a adoção do republicanismo na maioria dos países da América. Contudo, apesar das características liberais, como a idéia da res publica, a liberdade e a divisão dos poderes, na prática o que ocorreu foi a absoluta hegemonia das antigas elites criollas.
Com a adoção do voto censitário as camadas populares foram excluídas do processo decisório, o que facilitou a concentração do poder nas mãos dos grandes proprietários. Por outro lado, a elite crioulla, agora detentora do poder, continuou discriminando os negros, índios e mestiços. Foram mantidos, igualmente, os grandes latifúndios, com a sua produção voltada para o mercado externo.
Como foi visto, o processo de independência do América Latina aconteceu a partir da iniciativa de várias lideranças locais. Essa ausência de um poder centralizado fez com que surgisse o caudilhismo. Os caudilhos eram líderes de milícias locais que tinham uma personalidade carismática e defendiam programas populistas, de tal forma que conseguiam a adesão de muitas pessoas.
Como o caudilhismo levava em conta os interesses particulares, locais e o culto a personalidade, acabou contribuindo grandemente para a instabilidade na América Latina. A partir do caudilhismo, se desenvolveu o militarismo, o contínuo desrespeito à ordem constitucional, a tradição autoritária e os sucessivos golpes militares.
Os primeiros a se declararem emancipados foram a Venezuela, México, Equador, Argentina, Paraguai e Uruguai. Nesse contexto várias lideranças se destacaram, entre as principais Simon Bolívar e San Martín.
Pode-se dizer que Bolívar era um homem a frente de seu tempo, que conseguiu perceber as circunstancia do momento e a condição em que se encontrava a América Latina. Entre os princípios defendidos por Bolívar pode-se destacar:
- Nações livres, sem nenhuma interferência das potências estrangeiras e totalmente independentes, tanto política como economicamente;
- União dos povos, tanto com objetivo de formar blocos, sejam políticos ou econômicos, como para discutir problemas de ordem mundial.
Bolívar sonhava em manter a unidade da América espanhola, onde prevalecesse a união das nações americanas com o objetivo de suportar a agressão e a opressão das grandes potências externas.
Contudo, os sonhos de Bolívar não se realizaram, muito ao contrário, o que se observou foi à fragmentação política da América espanhola. Entre os motivos que contribuíram para essa fragmentação, pode-se destacar:
- Surgimento de diversas lideranças políticas e militares.
- A amplidão dos territórios e a longa distância entre os principais núcleos de poder. Além disso, a própria dinâmica da colonização espanhola, vigente por séculos respeitava a máxima “dividir para melhor centralizar”, ou seja, a Espanha procurava desarticular as ligações entre os centros de poder na colônia, reduzindo assim a possibilidade de organização das diferentes regiões da colônia.
- O desinteresse dos ingleses em relação à idéia de uma grande nação na América, nos moldes planificados por Bolívar.
- As disputas pelo poder entre as oligarquias locais, além das diferenças culturais em se tratando do amplo território que consistia o Império espanhol.
San Martin
- O avanço da Revolução Industrial na Inglaterra. Durante séculos a relação entre a metrópole e a colônia foi pautada pelo exclusivismo comercial, ou seja, somente a Espanha poderia vender mercadorias e comprar matérias-primas de sua colônia. Contudo, a prática do monopólio comercial era amplamente desfavorável aos interesses ingleses e ao avanço da Revolução Industrial, na medida em que restringia as relações comerciais, onerava os produtos e impedia a livre circulação das mercadorias industrializadas na Inglaterra. Esse fator explica o interesse da Inglaterra na independência das colônias espanholas, ou seja, o rompimento do pacto colonial possibilitaria o estabelecimento do livre comércio e do desenvolvimento do capitalismo industrial.
- A rivalidade entre os criollos e os chapetones. Na colonização da América espanhola se desenvolveu uma hierarquia social baseada em critérios étnicos e geográficos. Nessa hierarquia, os espanhóis brancos, chamados depreciativamente de chapetones ocupavam o topo e ocupavam as principais funções e cargos político-administrativos da colônia. Abaixo dos chapetones estavam os criollos, que eram os descendentes de espanhóis nascidos na América, e que apesar de consistirem enquanto europeus de raça e cultura e formarem uma elite local de grandes proprietários e comerciantes, eram estigmatizados, ou seja, eram considerados inferiores, por não serem genuinamente europeus e não podiam ocupar os altos cargos da administração colonial.
Cabe ressaltar que os criollos foram fundamentais para a manutenção do “Pacto Colonial”, contudo, o seu gradativo fortalecimento enquanto uma elite local rica e poderosa, além do grande desagrado e rivalidade em relação aos chapetones fez com que se disseminasse entre essa elite a idéia da ruptura em relação à Espanha.
- Influência dos ideais iluministas e da independência dos Estados Unidos. Mesmo sendo proibidos na colônia, os escritos dos iluministas alcançaram um grande público na América espanhola, em especial os princípios acerca da liberdade econômica e individual. Ao mesmo tempo, a independência dos EUA serviu como exemplo para o processo de emancipação da América espanhola.
- A expansão napoleônica. A expansão de Napoleão mudou as relações de poder na Europa. A não aceitação por parte da Espanha em relação ao Bloqueio Continental, fez com que as tropas francesas invadissem a península ibérica. Em 1807 o rei da Espanha, Fernando VII é deposto e José Bonaparte, irmão de Napoleão assume o trono espanhol. Com as turbulências na Europa, o domínio espanhol no continente americano ficou desestruturado. Num primeiro momento a elite colonial criticava a dominação dos franceses, mas brevemente perceberam a possibilidade de utilizar o momento para questionar mais amplamente o sistema colonial.
Sem a intensa dominação da metrópole, os colonos trataram de se organizar